Desde os três meses de vida, Rachel Campos, agora com 38 anos, lida com situações que tentam impor limitações nos seus objetivos. Isso porque, ainda bebê, perdeu totalmente a audição devido a uma medicação ministrada de forma errada por um médico.
Dentre os desafios enfrentados desde pequena, a moradora de Nova Andradina, relata que o maior foi aprender a leitura labial. “Tive sorte em ter o apoio da minha mãe que não mediu esforços para me ajudar a poder me comunicar”, explica.
A frustração também aconteceu na adolescência por se sentir deslocada e excluída. A formação em fisioterapia também ficou para trás. “Uma das poucas coisas que me trazia satisfação era assistir filmes, porém, me deparava muitas vezes com a falta de representatividade”, disse Rachel.
Foi então que, há seis anos, a sul-mato-grossense, conheceu Joice Oliver, que a convidou para participar de suas produções audiovisuais, em Porto Alegre (RS), “e para minha surpresa, eu teria espaço atrás e diante das câmeras”, enfatizou.
“Eu finalmente me senti completa, quero de todo meu coração contar grandes histórias e servir de exemplo para outras pessoas que possuam alguma limitação”, disse. Ela cita a participação em papeis que tiram a estigmatização da perda auditiva como um problema ou sofrimento.
“São papéis que trazem a naturalidade de que nós temos uma vida, grandes relatos e podemos viver romances, aventuras e tantas outras ações que a vida pode nos permitir. Inclusive, temos um lindo projeto onde eu serei protagonista”, comentou.
Volta para o MS
Atualmente, Rachel está em Mato Grosso do Sul, precisamente em Nova Andradina, para levantar verbas para viabilizar a finalização da produção do primeiro longa-metragem da América Latina sobre Dislexia, chamado Lição de Casa e produzido de forma independente com a amiga e produtora audiovisual, Joice.
A dislexia é um distúrbio genético que dificulta o aprendizado e a realização da leitura e da escrita. O cérebro, por razões ainda não muito bem esclarecidas, tem dificuldade para encadear as letras e formar as palavras, e não relaciona direito os sons às sílabas formadas.
Na cidade natal, ela tem vendido pipoca colorida para juntar a quantia. Questionada sobre o motivo de ter voltado ao Estado de origem para fazer isso, ela aponta “confio na generosidade do lugar onde nasci e sabia que seria mais fácil desta forma. As pessoas são incrivelmente solidárias”.
Além disso, Rachel conta com pequenos apoios de familiares e amigos, que se solidarizam com a causa do projeto, que, além da dislexia, abordará os desafios da educação e questões sociais decorrentes da gravidade da pandemia na vida da população mais humilde.
O Filme - Lição de Casa
Lucas é um menino incompreendido por sua dificuldade em ler e escrever. Ele vive com as duas irmãs e seus pais, Luciana e Marcos. O cotidiano da família é alterado com a chegada de Pilar, irmã de Luciana, que se torna responsável pelos cuidados dos sobrinhos, mesmo que a relação das irmãs ainda esteja abalada por questões familiares passadas.
Aos poucos, Pilar percebe a dificuldade de aprendizado de Lucas. Isso faz com que ela comece a investigar o que o menino possa ter, o que a leva a suspeita de Dislexia. Lucas inicia um forte laço de amizade com Maria Flor, a nova aluna deficiente visual da escola.
Flor é filha da professora Diana (mãe de Flor e Dudu), que foge para Porto Alegre depois de sofrer inúmeros abusos do marido. Com o advento da pandemia, as vidas destas famílias são transformadas, logo, eles precisam lidar com problemas e sentimentos guardados há muito tempo.
“Através do roteiro percebi, que todos temos nossas limitações e habilidades. Somos seres únicos e só precisamos de empatia para sermos enxergados como merecemos”, relatou Rachel.
A equipe o projeto é formada por pessoas disléxicas, com TDAH [Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade], além de alunos de regiões de extrema vulnerabilidade social.
Custos
De acordo com Rachel, as despesas de transporte e alimentação são viabilizadas por meio do apoio de colaboradores e doações. O elenco tem em torno de 20 pessoas, algumas já estão filmando e outras ainda filmarão pelo período de 45 diárias.
A equipe de filmagem se dispôs, voluntariamente, porém, ainda há dificuldade em manter o transporte e alimentação. Para finalizar as gravações, o grupo precisa em torno de R$10 mil, por isso disponibilizaram um pix para doação (Catrina Films – 97552136000146).
A produtora Catrina Films é credenciada na Ancine e colocará o longa-metragem em circuito de distribuição nacional e internacional.
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